Entrevista com o Demônio é o tipo de filme que você irá se deparar ao comprar ingressos e pensar que é mais um clichê do gênero de terror. De fato isso pode ser comum, dado em conta que desde O Exorcista (1973) o gênero de “demônios incorporando crianças” se tornou repetitivamente exaustivo.
Contudo ao dar uma chance para esse projeto, você percebe que mesmo a mais clichê das histórias ainda pode ser recontada de uma nova maneira, e acredite, sem a necessidade de um grande orçamento para te aterrorizar.
No filme acompanhamos o apresentador de um Talk Show noturno chamado Jack (David Dastmalchian) que promete no programa da noite entrevistar uma entidade sombria para enfim chegar ao topo da audiência televisiva.
Uma história baseada… em fatos mentirosos e reais?
Em 1977 foi iniciado o Projeto Stargate, que foi uma divisão secreta do governo americano responsável por estudar fenômenos psíquicos e como isso poderia ser aplicado na inteligência militar (SIM, isso aconteceu). Existem diversos vídeos na internet que mostram os testes bizarros que eram feitos pelo governo, e a partir do vazamento dessas informações, uma nova onda tomou conta da TV americana.
Uri Geller, um ilusionista da época surgiu na televisão afirmando ser capaz de ler a mente das pessoas e também controlar metal. Nos programas televisivos foram mostrados testes feitos por diferentes pesquisadores que “comprovavam” suas habilidades. Cada canal, cada programa, a partir disso tinha o seu próprio telepata.
Uma febre tomou de todos, e é claro, se tornou um sucesso. No passar dos anos a maioria dessas pessoas foram desmascaradas, mas até hoje vemos esses tipos de absurdo surgindo justamente por um motivo, audiência. Aquilo que é bizarro, sobrenatural e desconhecido sempre será atrativo para as pessoas.
Contudo, isso tem um preço.
A ambição e sede pelo poder
Esse é um tema de certa forma clichê no cinema, onde a sede por poder acaba corrompendo as pessoas. Contudo no terror é interessante apresentar as consequências disso da maneira mais cruel possível. No filme vemos como esse dilema é visto de diferentes perspectivas.
Contando com um elenco pequeno, temos o cético, aquela que acredita na entidade, aquele que tem medo, o empresário que quer dinheiro. Cada um deles possui uma certa vontade que é testada ao longo da narrativa.
O que você faria para ter fama? Essa é uma pergunta que ecoa durante todo o filme e além disso mostra que por trás dessa vontade está uma frágil personalidade que é criada somente para aparecer na televisão, afinal todos são personagens.
Apesar disso, nosso protagonista continua, e vemos como suas decisões afetam a vida não somente dele, mas de outras pessoas. Como mencionado anteriormente, esses casos também ocorreram na realidade onde vimos pessoas acreditando que estavam falando com parentes falecidos, ou casos de pessoas que desapareceram por medo após esses programas.
Na sede por audiência, somos apresentados a pior forma de entretenimento, o da dor humana.
A Sala de Edição aterrorizante
Entrevista com o Demônio foi dirigido, escrito e editado por Colin e Cameron Cairnes. Sendo um filme indie, eles usaram de somente um cenário e poucos atores para contar sua história. Além disso também usaram da ferramenta narrativa da câmeras de baixa qualidade que haveriam na época para fomentar uma boa ambientação.
Além disso, eles utilizam de uma edição dinâmica para não tornar a falta de orçamento um problema. Certamente ao assistir o filme você se recordará de filmes no estilo “mocumentário” que simulam a ideia de um falso documentário.
E essa dinâmica funciona em prol também do terror, afinal de contas parece que você está assistindo uma gravação corrompida encontrada no porão de um velho estranho. Usar de glitchs, cortes estranhos na edição, troca de fotografias para emular a gravação do programa e da vida real. A diversidade de elementos criativos tornam a experiência assustadoramente imersiva.
Nós como audiência, somos cativados por esse terror, ficamos tensos se segurando na poltrona não pelos sustos, mas pela tenção e sensação de estranheza. Apesar do final trágico, Jack consegue o que queria conosco, fazer um programa inesquecível.