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Gina Carano, banalização do nazismo e cultura do cancelamento

Gina Carano provavelmente ganhou o maior destaque midiático de sua carreira até então, ao ser demitida do elenco de O Mandaloriano pela Disney no dia 11 deste mês. Segundo o The Hollywood Reporter, uma fonte da Lucasfilm com conhecimento da situação disse que a empresa queria demitir a atriz há pelo menos dois meses. A decisão partiu diretamente dos executivos.

A gota d’água para a Disney aconteceu na semana passada quando ela compartilhou um post no Instagram no qual comparava a perseguição nazista aos judeus nos anos que antecederam o Holocausto com a perseguição a apoiadores do Partido Republicano, nos EUA atual. A imagem compartilhada, e já deletada, mostra uma mulher aterrorizada e machucada enquanto é perseguida por crianças em uma rua, usando apenas roupas íntimas.

Imagem

 

No frase que acompanha a imagem se lê: “Como a história é editada, a maioria das pessoas hoje não percebe que para chegar ao ponto onde soldados nazistas conseguiam prender milhares de judeus, o governo  fez com que seus próprios vizinhos os odiassem simplesmente por serem judeus. Como isso é diferente de odiar alguém apenas por suas visões políticas?“.

Ao anunciar a demissão dela, a Disney emitiu o seguinte comunicado: “Gina Carano atualmente não está empregada pela Lucasfilm e não há planos para que ela seja contratada no futuro. Ainda assim, seus posts nas redes sociais denegrindo pessoas baseadas em suas identidades religiosas e culturais são abomináveis e inaceitáveis“.

Confesso que não só levei um tempo para entender o que tinha acontecido no geral (as matérias a respeito estão muito incompletas), como também levei um tempo para entender por que a declaração dela seria antissemita. É preciso ser muito mal-intencionado para forçar uma interpretação assim. O post é raso, mas não é preconceituoso. Embora Carano não tenha demonstrado ódio aos judeus, como apontaram, a atriz fez algo quase tão errado quanto um ataque de ódio em si: Ela trivializou os horrores que os judeus enfrentaram durante o período anterior ao genocídio. É verdade que críticos do partido democrata e, principalmente, da política identitária tendem a ser demonizados tanto pela imprensa, quanto pelo seu círculo próximo de pessoas na América do Norte. Entretanto, os identitários ainda precisam involuir muito para chegar à perseguição nazista pré-Holocausto.

Nos anos que antecederam ao genocídio na Alemanha Nazista, o governo encorajou a população a boicotar estabelecimentos judeus. Posteriormente eles também foram proibidos de frequentar locais públicos, incluindo hospitais. Judeus não podiam se casar com não-judeus, que também eram proibidos de assumirem afazeres domésticos nas residências de famílias judias. Judeus também tiveram todas as suas propriedades confiscadas e crianças judias foram expulsas das escolas.

Banalizar nazismo é uma mania no debate político de hoje. Gina Carano não foi a primeira a fazer isso e nem vai ser a última. Aliás, seu colega de elenco em O Mandaloriano – Pedro Pascal, compartilhou no Instagram um post em junho de 2018 no qual comparava os EUA atual à Alemanha Nazista. No post do ator haviam duas imagens: A de cima mostrava crianças judias atrás de arames farpados em um campo de concentração, acompanhada da frase “Alemanha, 1944”. Já a imagem de baixo, acompanhada da frase “América, 2018”, mostrava crianças, supostamente imigrantes ilegais, atrás das grades. A foto na realidade foi tirada na Palestina em 2010 e as crianças da imagem estão aguardando uma refeição.

Imagem compartilhada por Pedro Pascal em junho de 2018.

 

Mesmo que Pascal tivesse usado uma foto verdadeira das instalações de detenção de imigrantes ilegais nos EUA para explicar seu raciocínio, ambas as situações não são remotamente parecidas. Por mais difíceis que sejam as condições de vida dos imigrantes que tentam a sorte naquele país (e a forma como as crianças são tratadas é questionável, sim), o fato é que imigração ilegal é crime nos EUA e, por ser um país com uma taxa alta de imigração, não dá para simplesmente abrir as portas para todo mundo, isso traz impactos para o país. Duvida? Veja a situação de Roraima com os venezuelanos, ou dos haitianos no Acre. Integrá-los à nova sociedade é um imenso desafio, que demanda muito mais do que recursos financeiros.

Assim como no Brasil, a lei americana estabelece requisitos que todos os estrangeiros precisam cumprir se quiserem emigrar para lá e existe penalidade para quem não cumpri-los. Por imigração ilegal ser crime, os acusados se submetem aos procedimentos processuais da lei americana, o que inclui ter direito a um advogado; assim como aconteceria na prática de qualquer outro crime. A administração Obama, assim como a de Trump, encarcerou imigrantes ilegais e o governo Biden vai continuar a fazer isso. Ainda assim, os EUA são o país com o maior número absoluto de imigrantes: 44 milhões de pessoas que compõem 19% da população, de acordo com dados de 2018, fornecidos pela ONG Conselho Americano de Imigração, sediada em Washington.

Diante dessas informações, não dá pra “meter o louco” e dizer que os Estados Unidos perseguem imigrantes ilegais como os nazistas perseguiam judeus. O mesmo vale para a situação dos republicanos ou de qualquer outra pessoa que questione a ortodoxia do momento. Por mais que os justiceiros sociais sejam um bando de ditadorezinhos tentando arruinar a vida de qualquer um que não feche 100% com as ideias deles, dizer que os EUA são a Alemanha dos anos 30 é simplesmente falta de noção. Aqui no Brasil, essa idiotice também é moda. Imagina você chegar para um sobrevivente do Holocausto ou do massacre em Ruanda e dizer a eles que você também é sobrevivente de um genocídio? Se você é uma dessas pessoas, pare.

O que aconteceu a Pedro Pascal depois de ter postado essa bobagem? Isso mesmo, nada. Não que Pascal merecesse ser demitido, mas a diferença entre a repercussão do posicionamento dele e da ex-colega é gritante. Para Hollywood, para os jornalistas e para as redes sociais, o problema não é o QUE você diz, mas QUEM diz.

Se a gente vai cancelar todo mundo em Hollywood por causa de opiniões idiotas não vai sobrar ninguém, iríamos nos privar do talento de grandes artistas. Jim Carrey e Robert DeNiro são anti-vacinas (assim como a Hollywood inteira também é, embora eles achem as opiniões deles muito importantes), Whoopi Goldberg acha que o pouso na lua é uma mentira e Mark Ruffalo duvida da versão oficial do 11 de setembro (ele é outro que tem como hobby comparar republicanos a nazistas).

Além deste último comentário que causou sua demissão, Gina Carano também é alegadamente contra o uso de máscaras e chegou a fazer piada com a obrigatoriedade delas, como neste post:

 

Na imagem se lê: “Urgente. Líderes do governo democrata agora recomendam que todos nós usemos vendas junto com máscaras para que não vejamos o que realmente está acontecendo“.

Ela também deixou seu posicionamento bem claro sobre o confinamento (que aqui inventaram de chamar de “lockdown”, sabe-se lá por que):

Nos dois posts, Carano escreveu: “Abram os seus negócios e igrejas. Estabeleçam seja lá qual for as normas que vocês quiserem, pois esse é o direito de vocês, mas abram. Vocês estão me dizendo que a COVID-19 sabe a diferença entre um protesto e um louvor ou adoração. Não fui à igreja há mais de uma década, mas com certeza iria agora“. Na continuação, ela diz: “O mundo ESTÁ aberto, mas ninguém está autorizado a trabalhar. O trabalho é um direito que você, como americano, tem. Nos dá propósito, foco, orgulho e, o mais importante, uma forma de apoiar aqueles que amamos. As pessoas estão sucumbindo em peso para a depressão e o suicídio; overdose; ASSASSINATO. Já chega“.

Ok, tirando o apelo à emoção (assassinatoooo), nesse ponto ela não falou nada demais. Não dá para todo mundo simplesmente ficar trancado em casa. As contas não vão parar de chegar. E não dá para negar também que a posição da imprensa sobre aglomerações dependia bastante do tipo de aglomeração, como este repórter fez questão de nos lembrar. Um cidadão qualquer vê esse padrão duplo e vai ficar inevitavelmente confuso. Como essa aglomeração na praia vai contribuir para a transmissão do vírus e esta manifestação antifa não vai? Seria o vírus da COVID-19 o primeiro com consciência social?? Enfim, deixa para lá, afinal, não dá para criticar os ANTIFASCISTAS por se aglomerarem, né. Só fascista criticaria os ANTIfascistas e já que você não quer que ninguém pense que você é um fascista, então trate logo de concordar com tudo que eles digam e façam.

Entenda, não tenho problema nenhum com distanciamento social, já era praticante assídua dele muito antes de virar moda. Meu problema mesmo é com o tal de “dois pesos e duas medidas”. De novo, não importa o “quê”, mas o “quem”. Enfim, voltemos a Gina, que também duvidou dos resultados das eleições e pediu mais transparência:

Aqui ela diz: “Precisamos limpar o processo eleitoral para que não nos sintamos do jeito que nos sentimos hoje. Estabeleçam leis que nos protejam contra a fraude eleitoral. Investiguem cada estado. Filmem a contagem. Revelem os votos falsos. Exijam RG. Façam a fraude eleitoral acabar em 2020“.

O Mickey não é obrigado a contratar Gina Carano, mas é fato que ela não foi demitida simplesmente por seus “comentários abomináveis”, como dito na declaração do estúdio. Quando uma empresa gigantesca como a Disney aceita se curvar a uma turba virtual ensandecida, ela dá poder a eles, se torna cúmplice do cancelamento que acontecerá. Os linchadores se sentem mais ainda no controle para julgar e destruir a sua vida de quem quer que seja, e o que é pior, pelos motivos mais bobos possíveis.

Proibir gente como a Carano e o Pascal de falar imbecilidades é abrir um precedente para proibir qualquer opinião diferente. Lembre-se: Por mais sensatas que as suas opiniões sejam, sempre vai ter um grupo para achá-las imbecis e/ou nocivas à sociedade. Imagine esse mesmo grupo tendo poder para ditar o que pode ser dito e o que não pode. Não há como traçar um limite à liberdade de expressão com base no que pode ser ofensivo, justamente porque ofensa é subjetiva. A palavra tem um peso diferente para cada pessoa. Os limites à essa liberdade devem ser aqueles que são objetivos, como a ameaça, a calúnia, o assédio e a difamação, pois o estrago causado por uma delas é possível de ser mensurado, o que não acontece quando se trata de ofensa.

A demissão de Carano é parte de um panorama mais amplo. A executiva da Sony, Amy Pascal, foi demitida da empresa depois de aparecer fazendo uma piada supostamente racista com Barack Obama num e-mail privado que vazou. Chris Pratt é alvo de ataques nas redes sociais por ser republicano e evangélico, mesmo sendo um sujeito discreto quanto a isso. James Gunn até hoje é chamado de pedófilo por causa de uns tuítes imbecis publicados há anos. Não existe evidência alguma de que ele tenha molestado alguém, mas quem se importa com coisas como justiça e processo legal, não é mesmo? Letitia Wright foi outra que publicou umas maluquices no twitter, o que levou a turba revoltada das redes sociais a pedirem a cabeça dela também. Ela encerrou sua conta, provavelmente aconselhada por seu círculo. Foi melhor assim, não dá pra jogar uma franquia de super-herói fora.

Alguns diriam que essa é a consequência de falar idiotices na rede social, mas como eu já disse, é necessário olhar o quadro amplo. Em 2017, o engenheiro do Google James Damore foi demitido da empresa por questionar suas políticas de diversidade. Entre as afirmações do engenheiro, uma delas questionava a reserva de 50% das vagas de engenharia de computação para as mulheres, sendo que elas representam uma minoria entre os candidatos, visto que tem menos interesse na área do que os homens. Damore foi demitido e em seguida processou o Google, alegando que a sua dispensa aconteceu por não concordar com a política de diversidade implantada e por ser um “homem branco”. Os dois lados fizeram um acordo.

Ano passado, em meio aos protestos do caso George Floyd, a apresentadora de TV e influencer canadense Jessica Mulroney teve a carreira arruinada quando postou uma frase de Martin Luther King no Instagram e outra influencer – Sasha Exeter, reprovou o post porque aparentemente não era antirracista o suficiente (????). Mulroney foi na DM de Exeter perguntar o que havia feito de errado. Sasha deu um sermão sobre a outra ser uma uma branca privilegiada e então levou a troca de mensagens entre as duas à público, dizendo que foi ameaçada por Mulroney. O fato de Exeter ser negra e Mulroney ser branca e rica foi o que bastou para todos ficarem ao lado da primeira. Já Mulroney precisou lidar até com o afastamento de pessoas que considerava amigas. Esta é a versão resumida, a longa está aqui.

Teve também o caso do colunista de ciência do The New York Times, Donald McNeil, que saiu do jornal depois de 46 anos de trabalho, quando o teor de uma conversa racista que teve no ano de 2019 foi divulgado. Só para contextualizar, a cada ano o jornal escolhe um de seus principais jornalistas para acompanhar um grupo de estudantes de ensino médio a um passeio educativo em algum lugar do mundo. Em 2019, Donald foi ao Peru junto com um grupo de estudantes, quando o seguinte diálogo racista se seguiu entre ele e uma das alunas sobre o uso do termo ‘nigger’, que em português significa simplesmente ‘negro’, mas que tem uma conotação pejorativa nos EUA. A conversa entre ele e a aluna foi mais ou menos assim:

Aluna: “Uma amiga minha gravou um vídeo falando ‘nigger’ quando tinha 12 anos. Ela deveria ser suspensa por isso?”

Donald: “Como assim? Ela ‘tava cantando um rap, citando um livro, ou chamou mesmo alguém de ‘nigger’?”.

Esta foi a conversa que causou a demissão de McNeil do jornal. Ele pediu desculpas, disse que não deveria ter usado o termo, mas de nada adiantou. Não acredita? Veja mais aqui. A investigação interna apontou que a infração não era digna de dispensa, mas tudo mudou quando 150 funcionários do jornal assinaram uma carta pedindo a demissão de McNeil. Quando outros jornalistas apontaram que McNeil não teve a intenção ofender ninguém, o editor executivo do The New York Times, Dean Baquet, respondeu num comunicado que “intenções não importam”. Sério. Depois ele recuou quando confrontado.

Ainda falando em ‘nigger’, um adolescente vingativo e pardo – Jimmy Galligan – guardou por 3 anos um vídeo de uma colega de ensino médio, Mimi Groves, no qual ela aparecia comemorando sua autorização para dirigir. A moça, que tinha 15 anos na ocasião, dizia no vídeo: “I can drive, ‘nigger‘” (“Eu posso dirigir, ‘nigger'”). A frase não foi dirigida a ninguém em especial, mas isso não impediu que Jimmy guardasse o vídeo e esperasse pacientemente pelo “momento certo” para dar uma lição nessa racista safada.  Quando esse momento finalmente chegou, Mimi já tinha 18 anos e estudava na Universidade do Tenessesse há alguns meses, onde também era ‘cheerleader’. As imagens viralizaram e Mimi perdeu não só sua função de cheerleader, como também sua vaga na universidade. Para piorar, o The New York Times (de novo) publicou uma matéria sobre o caso, retratando Galligan como um herói por ter exposto a menina. Nenhum dos adultos envolvidos na matéria se importou com o fato de que Mimi só tinha 15 anos na época e que adolescentes fazem merda. Se a turma da empatia acredita que adultos podem melhorar, porque adolescentes deveriam agir como adultos amadurecidos, então? O mesmo vale para Galligan. O que ele fez foi terrível, mas ele também é outro adolescente. Ademais, é triste ver o que o outrora respeitado NYT se tornou, deixando de cobrir pautas importantes para dar destaque a adolescentes fazendo merdas que adolescentes sempre fazem, e arruinando a vida de um deles no processo antes de sequer chegar à fase adulta. Quem tem mais de 25 anos deu sorte, as bobagens desta fase da vida ficaram enterradas no tempo. Os antigos fãs do Restart, por exemplo, hoje devem morrer por dentro ao verem a si mesmos em vídeos como esse.

Se mergulharmos na internet, vamos achar mais casos da “justiça” sendo feita: o cara que foi confundido com um supremacista branco ao ser flagrado fazendo um sinal de OK no trânsito. Ele perdeu o emprego que tinha e não conseguiu achar um novo; Os alunos que fizeram um abaixo-assinado para demitir um professor que dormiu num curso sobre diversidade; professor de antropologia em Princenton teve aula sobre direitos e liberdade de expressão cancelada ao usar um termo considerado ofensivo pelos alunos e se recusar a pedir desculpas; pesquisador que estudava disforia de gênero em crianças teve a sua clínica fechada porque sua pesquisa desagrada os ativistas. Ele concluiu que a maioria das crianças consideradas trans cresciam em conformidade com seu sexo; Uma escritora americana foi ameaçada fisicamente por outros escritores latinos e teve sua turnê cancelada porque fez um romance sem ter “lugar de fala”. Nem o fato de ser elogiada por Stephen King a ajudou; teve também o pesquisador que foi demitido ao pesquisar diversidade evolutiva humana; Mulher escreve que não apoia o Black Lives Matter, perde o emprego por pressão de ativistas, que também derrubaram uma vaquinha on-line feita para ajudá-la. Um palestino dono de restaurante nos EUA teve seus dados expostos, sofreu ameaças e ataques virtuais e teve seu negócio ameaçado por causa de umas postagens imbecis que a filha de 14 anos escreveu anos antes; um analista de dados foi demitido ao compartilhar um estudo de um pesquisador negro que concluiu que protestos violentos são menos efetivos que protestos pacíficos. Um pesquisador do CERN foi suspenso por alegar que a física não é sexista e apresentar dados para isso. Enfim, os casos do tipo são inúmeros e acontecem até no Brasil.

Diante de tudo isso, não dá para olhar para este cenário e achar que a demissão de Carano é apenas um caso de funcionária desbocada que gosta de se meter em confusão nas redes sociais. É resultado do atual espírito dos nossos tempos. Numa matéria divulgada dia 16 deste mês pelo Hollywood Reporter sobre os bastidores da demissão da atriz, a relações públicas especializada em gerenciamento de crise, Juda Engelmayer, comentou o seguinte sobre o clima atual: “Não sei em quê as pessoas na Disney acreditam ou não acreditam à nível pessoal em relação à política, mas como empresa, eles querem ficar o mais distante possível de problemas. E qualquer coisa que ofenda a esquerda é um problema“. Ela continua: “Tenho clientes que estão fazendo um esforço extraordinário para postar o que a esquerda social quer ver“.

Carano acha que a atual divisão política de seu país pode levar a um extermínio de quem não apoia os democratas, caso nada seja feito. Se isso vai acontecer, ninguém sabe. Eu chutaria outra coisa. O clima atual parece uma versão light do Marcartismo nos anos 1950, que foi uma época nos EUA na qual você era suspeito de ser comunista até mesmo se fosse amigo de outro suspeito, provas não eram importantes para ser acusado. Em se tratando de Hollywood, havia uma “Lista Negra”, uma relação não-oficial de artistas considerados simpatizantes do comunismo, muitos deles sem evidências. Consequentemente, muita gente ficou sem trabalhar e, no pior dos casos, teve a carreira destruída, como foi o caso de Dorothy Comingnore, de Cidadão Kane. Outros até conseguiam trabalhos, mas não podiam ter seu nome associado a eles para não prejudicar os outros envolvidos no projeto, como aconteceu com Dalton Trumbo (Spartacus). Foram vários casos. Aqui no site, inclusive já foi feita uma coluna sobre o tema. Resta a conferir se esse Marcartismo light vai evoluir para o nível que chegou durante os anos 50.

Mas não se engane, este é o mundo que os canceladores/exibicionistas morais querem construir. A parte chata de uma cultura na qual todo mundo procura motivos para linchar alguém toda hora é que inevitavelmente a turba ensandecida vai chegar até você em algum momento e te acusar de algo, ainda que de forma injusta. A tal da cultura do cancelamento é autofágica, nem os canceladores espiritualmente evoluídos são poupados. E isso não é de hoje. Olha a Revolução Francesa: Em um momento os próprios jacobinos começaram a se guilhotinar, o cancelamento só acontecia uma única vez.

Gina Carano pode ter errado feio ao banalizar o nazismo, mas isso não muda o fato de que ela foi demitida pelo o que ela pensa. Enquanto pessoas e empresas se curvarem às demandas dos “heróis da justiça social”, esta perseguição só tende a se intensificar, daí será só uma questão de tempo até a Lista Negra ser algo comum não só nos EUA, como no resto do mundo também. Só espero que os canceladores se devorem antes de disso acontecer.