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Crítica: Não, Não Olhe! (Nope) | Um retrato sobre as injustiças e desejos por trás da “fama”

Jordan Peele foi uma das grandes surpresas do cinema nos últimos anos. Tendo saído da comédia, ele surgiu através de Corra! (2017) e logo em seguida trabalhando na nova série de Além da Imaginação (2019), e retornando aos cinemas com Nós (2019). A mídia em geral definiu um diretor como alguém de grande nome, mas que não manteve a qualidade do seu primeiro filme. Entretanto aqui vemos o encontro do cineasta com a ficção científica, e ao lado disso os melhores trejeitos dele. Uma combinação inesperada, assim como o final dessa história.

Acompanhamos os irmãos O.J (Daniel Kaluuya) e Esmerald (Keke Palmer) que após o falecimento do seu pai, eles precisam restaurar a fazendo de cavalos treinados para filmes, séries e etc. O problema começa quando os irmãos começam a avistar algo no céu, e eventos estranhos que começam a ocorrer por toda região.

Uma fuga dos filmes de aliens

Os irmãos protagonistas de Não, Não Olhe!

E já nos primeiros minutos da história, somos apresentados de forma dinâmica para esses acontecimentos, e também aos personagens dos quais imediatamente nos apegamos. A diferença entre os dois, com o O.J sendo mais introvertido e apegado ao legado de seu pai, e Esmerald que busca se consolidar individualmente e não tem um apego tão grande ao negócio. Os dois formam um contra ponto interessante que ao longo da trama é desenvolvido e aprofundado, onde vemos que independente de tudo, ainda são uma família.

Aqui as regras são subvertidas pelo diretor, desde o tom do filme, até a sua edição. Nicholas Monsour (Nós) ajuda nisso com algo disruptivo, onde temos cortes bruscos, e uma montagem feita para confundir a audiência. E apesar de tudo isso, ela ainda consegue se encaixar para a interpretação do público sobre esses acontecimentos, nos fazendo pensar sobre aqueles momentos que estamos vendo.

E aqui talvez tenhamos o trabalho mais ousado em escala do diretor, onde a combinação com o diretor de fotografia Hoyte van Hoytema (Dunkirk) permite elevar o nível desse ponto. A utilização de planos abertos em um cenário desértico casam para a criação de um ambiente ameaçador e que amplia o medo do desconhecido. Não somente isso, mas aqui temos um Jordan Peele inspirado na sua direção, fazendo com que tenhamos cenas marcantes e que sem dúvida irão entrar para a história da cinebiografia do cineasta (e aquela cena da casa sendo talvez a mais marcante). É evidente as referências a outros filmes do gênero como Contato Imediato de Terceiro Grau e Sinais, mas o minimalismo do diretor permanece, focando somente em um pequeno núcleo dessa história.

Pode até mesmo ser questionável o fator terror do filme, não tendo uma presença similar aos seus outros projeto. Entretanto o que gera a real tensão e terror, é o medo do desconhecido tendo influência a Lovecraft. A combinação da direção, fotografia e com um importante papel, a trilha sonora de Michael Abels (Corra! e Nós) fazem o nível de tensão ser elevado nos fazendo ficar presos na cadeira do cinema.

Um encontro de entretenimento e debates

E claramente não ficaria de fora as questões sociais abordadas pelo diretor na trama. Aqui o principal destaque talvez fique para a forma como tentamos ao máximo alcançar uma suposta fama. Através disso nós abusamos do poder sobre os outros, e vemos então como aquilo retorna para nós de forma nada agradável. Tendo como ponto de vista os cavalos e animais usados em filmes e séries, vemos essa perspectiva de forma mais clara, onde nós humanos abusávamos de outras criaturas pensando que isso não teria consequências.

Fora isso também surge a questão racial de diferenças no alcance dessa suposta fama. Enquanto temos a família de Jupe (Steven Yeun) utilizando de traumas e erros do passado como forma de mercadoria e ascenção, O.J e Esmerald buscam através dessa fama não como comércio, mas reparação do legado do seu pai e também deles no futuro que desejam alcançar. E com dilemas sociais sendo abordados, aqui vemos o equilíbrio entre o entretenimento e o debate, não perdendo o ritmo em nenhum momento e nos fazendo chorar, ficar tensos e até mesmo nos surpreender com referências inesperadas em Não, Não Olhe!