Esse ano tivemos a oportunidade de estarmos presentes na Bienal do Livro do Rio. Pude visitar vários stands, conhecer alguns autores e também aproveitar um pouco dos livros que estavam disponíveis para compra no evento, assim como suas ativações. Só que após eu chegar em casa, me deparei com um pensamento… estamos de fato incentivando a leitura com esse evento?
A Bienal é um evento que acontece desde 1983 e virou uma grande referência em todo Brasil, levando o evento do Rio para São Paulo, Belo Horizonte e outras cidades espalhadas pelo país. Nela temos a participação de diversas editoras que levam seus autores renomados e também seus títulos para serem apreciados pelo público.
Para além das editoras, também temos espaços disponibilizados para projetos independentes e autores que desejam lançar seus livros e apresentar de alguma forma ao público. Também há espaço para conversas, entrevistas e ativações como um “Escape Room” tendo premiações no final de cada um deles.
Nesse ano a proposta não foi diferente, mas quando cheguei no evento já me deparei com a quantidade gigantesca de pessoas. E olhando para edições anteriores, sempre teve muitas pessoas, mas ouvi desde amigos até colegas da internet sobre o fato de que essa lotação era em todos os principais dias.
O caos controlado da Bienal do Livro
Chegando ao evento, não me assustei com a quantidade de pessoas, afinal de contas já havia participado de eventos similares anteriormente. Caso você já tenha ido em uma BGS por exemplo, consegue entender o que estou dizendo.
A questão nesse caso é que se você opta por participar de um evento dessa magnitude, tem que entender que você vai lidar com filas, pessoas trombando com você e demais situações que ocorrem em eventos desse tamanho. Contudo tem algo que pode dificultar a experiência de todos, a organização.
Não irei citar alguns exemplos diretamente, mas algumas ativações e stands tinham uma grande carícia de organização. Falta de direcionamento sobre como funcionava, onde pegar informações e até mesmo caso você quisesse comprar um livro da editora, enfrentava dificuldades de locomoção.
Se determinada editora desejasse fazer algo diferente, que ao menos se preocupasse com aqueles que desejam somente ver os títulos disponíveis para serem adquiridos no evento. E enquanto grandes nomes sofriam com superlotações, os pequenos estavam ali esperando por uma oportunidade.
A guerrilha do incentivo aos novos leitores
Pela internet pude ver certos comentários falando sobre os “leitores de Tik Tok” que estragavam a experiência do evento. E na Bienal tivemos algumas novidades como um espaço dedicado aos autores que se destacaram na plataforma. Tivemos até a visita da autora Lynn Painter que ganhou popularidade mundialmente na plataforma por seus livros de romance.
E enquanto muitos olham para isso como um problema, eu vejo como ferramenta. A realidade é que estamos enfrentando uma guerra cultural. Onde nela enfrentamos o desincentivo à leitura, direcionamento para uma cultura elitizada e movimentos que buscam enviesar as pessoas com um “café” por exemplo.
Então o incentivo precisa continuar acontecendo independente das vias que utilizarmos, ainda mais para os jovens que consomem em excesso as redes sociais. Para além disso, abrir as portas para a diversidade literária. Se alguém leu um romance, ela talvez leia uma fantasia no futuro, ou uma ficção científica que seja de uma autora conhecida.
Há um problema, e ele não se encontra em autores que ficaram famosos nas redes sociais. Afinal de contas as redes são muita das vezes o único meio deles de divulgarem seus projetos.
Um problema para o futuro
Uma situação que a comunidade nerd enfrentou e está sofrendo atualmente se encontra justamente em eventos como a própria CCXP. Inicialmente esses eventos serviam para a divulgação de projetos de grandes ou pequenos estúdios, editoras, autores e entre outros. A própria Comic Con dos EUA se iniciou dessa forma.
Hoje esses eventos são focados em grandes produções e trazer até mesmo pessoas de fora do nicho. E com isso foi construído não um ambiente dos criadores, e sim de consumo.
Quando vemos esses eventos hoje, eles falam mais sobre “compre esse boneco edição ilimitada deluxe divine que vai estar somente aqui” ao invés de “tenho um quadrinho novo, venham conferir”. Problema esse que autores independentes enfrentam ao tentarem colocar um stand nos eventos.
Com a Bienal parece não ser diferente. Eu percebi no evento muitas situações de “ganhe uma bolsa”, “ganhe um marca-página” e entre outros tipos de bonificações para incentivar a compra. O que no primeiro momento, não é um problema, mas pode ser algo prejudicial para o futuro.
Porque com essas ações aumentando, se tornará cada vez mais normal a compra não de novos autores ou diferentes livros para ampliar o incentivo, mas somente daquilo que “faz sucesso”. Desde o relançamento de uma nova edição de Harry Potter ou a vigésima quinta tradução deluxe de Percy Jackson.
O consumo precisa existir para as editoras continuarem produzindo e trazendo novas histórias para o seu catálogo, mas ao mesmo tempo esse mesmo consumo pode ser uma armadilha. No final você se tornará um refém daquela mesma estratégia.
Apesar de tudo, ainda temos uma festa da literatura
Mesmo com esses apontamentos, ainda foi divertido participar. Pude conhecer pessoas, compartilhar interesses e ver que ainda temos novos leitores chegando para conhecer esse mundo. Fora que foi muito gratificante ver certos movimentos para ajudar alguns autores independentes e conhecer seus trabalhos.
A luta pelo incentivo à literatura continua, com novos problemas e velhos inimigos, mas ainda permanecemos de pé. A pergunta que fica é: O que fazer quando um livro acaba? Conhecer uma nova história ou explorar novamente a mesma história com um bônus especial?