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Arlequina é mesmo o quarto pilar da DC? | Uma reflexão sobre Aves de Rapina e bilheteria

Foto Divulgação

Parece que todos superestimamos a força da Arlequina no mainstream.

Quando Esquadrão Suicida foi lançado, há quase quatro (!) anos atrás, foi massacrado com força pela crítica, mas o excelente marketing trouxe ao filme uma abertura de 135 mi de dólares e uma arrecadação mundial de aproximadamente US$ 740 mi, sem a China. Algo impressionante. O filme caiu no gosto do público mais jovem, principalmente entre os adolescentes. Segundo o CinemaScore, o filme recebeu uma nota “A-” entre o público abaixo de 18 anos e nota “B” do público em geral.

Tudo o que se via nas convenções de cultura pop realizadas nos meses seguintes eram cosplayers da Arlequina. Além do sucesso do filme, acredito que a facilidade de se fantasiar como a personagem também foi um fator, afinal, você não precisa fazer algo muito elaborado, como as cosplayers de Mulher-Maravilha fazem, por exemplo. É um figurino fácil de reproduzir. Outra observação é que a Arlequina como par romântico do Coringa também foi um sucesso, como mostram as várias fotos de jovens casais fantasiados como os dois personagens, que você certamente já deve ter visto, e que não passaram despercebidas pelos zoeiros da internet. Vejam a quantidade de paródias e clipes musicais inspirados no filme postados somente no YouTube BR.

Com tanto sucesso, era de se esperar que a Warner Bros trabalhasse numa continuação, e depois de alguns anos, com a saída de diretores e vários roteiristas do projeto, James Gunn foi contratado e o filme atualmente está em produção no Panamá.

Margot Robbie, a Arlequina, também achou que seria interessante explorar os filmes de super-heróis e ela própria contratou um roteirista e apresentou o projeto a Warner. Anos depois o esforço resultaria em Aves de Rapina: Arlequina e a sua Emancipação Fantabulosa. O filme custou cerca de US$ 85 milhões para ser feito, sem contar os custos de marketing e estreou no último dia 05 no Brasil.

Se considerarmos o cenário atual para os filmes de super-herói, era de se esperar que Aves de Rapina (como vamos nos referir a ele de agora em diante nesse texto) estreasse com uns US$ 50 mi, pelo menos. A expectativa inicial da Warner era de um valor entre US$ 45 mi e US$ 50 mi, como aconteceu com Shazam! no ano passado. Como todos sabemos, os números oficiais da estreia foram de apenas US$ 33 mi. Bem abaixo de outros filmes baseados em HQ.

Segundo o jornalista e crítico Scott Mendelson, da Forbes, Aves de Rapina apresenta o mesmo desempenho de John Wick 2 nos EUA, apesar de ter mais bilheteria no exterior do que o longa de Keanu Reeves. No entanto, os custos do filme da DC são os mesmos que a Lionsgate gastou em John Wick 3. Pelos cálculos dele, o filme deve alcançar um valor próximo a 255 milhões na bilheteria final. Até agora foram 148 milhões de dólares arrecadados no mundo.

Fracasso? Talvez. Mas certamente esse resultado foi uma decepção para os envolvidos. Semana passada escrevi sobre o filme, no qual mencionei brevemente alguns pontos que explicavam o desinteresse no longa. Entretanto o foco do texto não era exatamente o de explorar o que levou o projeto da DC a esses números fracos na estreia, mas o de discutir o fato do longa ter sido apropriado de forma tola por militantes de internet, com o intuito de reforçarem seus respectivos discursos.

Aves de Rapina teve boas críticas, porém isso não se converteu em boa bilheteria, o que demonstra mais uma vez que críticas de cinema não são assim tão influentes a ponto de determinar o sucesso de um filme. Talvez ajudem a divulgar filmes independentes, mas produções de estúdios milionários? Já vimos que não. Em filmes do tipo, o marketing é fundamental para conseguir bons números na estreia, mas daí em diante o filme só se mantém com o boca-a-boca de quem foi conferir antes.

A seguir vou enumerar algumas causas que considero que podem ter levado a esse desempenho fraco. No entanto, quem discordar sinta-se livre para fazer isso nos comentários.

 

  • Censura R-Rated

Nos EUA, as classificações indicativas dos filmes se dividem em G, PG, PG-13, R-Rated e NC-17. “G” se aplica aos filmes permitidos para todo o público, é a versão americana da nossa “censura livre”; “PG” significa “Parental Guidance Suggested, filmes que podem ter conteúdo sensível; PG-13 contém material inapropriado para jovens com menos de 13 anos, R-Rated são filmes proibidos para menores de 17 anos, que no entanto ainda podem assistir ao filme acompanhados por um responsável; já o NC-17 são filmes que só podem ser assistidos por adultos.

Dito isto, podemos ir direto ao assunto: Por que um filme protagonizado por Arlequina foi classificado como R-Rated? Ela é uma personagem que claramente tem um apelo com pré-adolescentes e adolescentes de fato. Restringir dessa forma a entrada do público-alvo foi um enorme tiro no pé e praticamente condenou o filme a esse resultado decepcionante. Margot Robbie deve estar muito arrependida de ter insistido para o filme ser R-Rated enquanto a WB queria um filme PG-13, como de costume. Os executivos estavam certos dessa vez.

 

  • Ligação com Esquadrão Suicida

Aves de Rapina mostrou que Arlequina não tem toda essa popularidade que achávamos que ela tinha. Enquanto Coringa foi usado para atrair público para Esquadrão Suicida, protagonizou filme bilionário e ganhou 3 Oscars (incluindo o do Heath Ledger), o filme da ex-namorada luta para ultrapassar US$ 200 mi nas bilheterias.

Curiosamente Esquadrão Suicida pode ter contribuído para afastar de Aves de Rapina até quem gostou do filme. Arlequina era destaque porque foi o par romântico do Coringa e, sabe-se-lá por que, a bizarrice do casal conquistou uma porção grande do público jovem. Sem o Coringa, boa parte do apelo dela se perdeu para esse público. Já quem não gostou de Esquadrão Suicida obviamente não vai se empolgar para assistir a um filme que parece um derivado desse desastre cinematográfico.

 

  • Trailers Ruins

Vamos admitir: Esses trailers de Aves de Rapina foram fraquíssimos. Sério, o que eles esperavam transmitir ao público com cenas genéricas de luta e com a Arlequina dizendo frases empoderadas de efeito? Outro detalhe é o fato de toda a estética exibida trazer más recordações de Esquadrão Suicida. Analisando pelo conjunto, não é de se admirar que fora da bolha nerd ninguém entrou no hype.

Faltou também dizer ao público quem seria a Arlequina. Agora que ela não tem mais o Coringa, quem ela seria? Ela não é heroína, também não é vilã. Sobre o que se trata e por que as pessoas deveriam pagar para ver um filme que, aparentemente, é mais um genérico qualquer de ação? Mulheres batendo em caras maus deixou de ser novidade há uns 20 anos, pelo menos.

 

Considerações Finais

Os mitadores gostam de dizer que o filme fracassou exclusivamente porque alienou o público masculino, enquanto as feministas acusam o público em geral de sexismo. Nenhum dos dois está correto, evidentemente. Dessa história toda, concluímos que a Arlequina não é exatamente o quarto pilar da DC. É verdade que ela vende mais quadrinhos que todos os personagens da editora com exceção do Batman, está em séries animadas como àquela que protagoniza no streaming DC Universe (dizem que é excelente) e é personagem fixo na bem sucedida DC SuperHero Girls, mas para o público como um todo, ela ainda é a “muié do Coringa”. A WB cometeu um erro quando achou que ela teria o mesmo apelo do vilão, mas sinceramente, quem pode culpar o estúdio? Todos nós acreditamos que ela também tinha esse apelo.

Alguns fãs podem argumentar que a caracterização do grupo de heroínas está bem infiel ao que é nos gibis e é verdade, mas os leitores de HQs são um grupo ínfimo perto do tamanho do público geral, que em sua maioria desconhece esses personagens. Isso é algo que a Marvel não precisa lidar, porque antes dela trazer seus personagens para o grande público, quase ninguém os conhecia, com algumas exceções, é claro. De qualquer forma, fidelidade é irrelevante para o espectador médio.

No estado de coisas atual, a gente pode até concluir que o quarto pilar da DC é o próprio Coringa.