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Vivendo “MELANCOLIA” nos tempos de uma pandemia

O ano era 2011. O diretor era o polêmico dinamarquês Lars Von Trier. O filme era uma apoteose catártica chama Melancolia.

A história de um planeta misterioso prestes a colidir com a Terra ficou famosa (muito por conta da proximidade com o ano de 2012, no qual diversas teorias apocalípticas estavam em alta), mas também por abordar um tema complexo e urgente dentro da sociedade: a depressão.

Quando Justine (interpretada brilhantemente por Kirsten Dunst) abandona o seu marido em plena festa de casamento, ela acaba se afundando profundamente na doença que aterrorizava sua alma desde a infância. No processo de esgotamento mental e grave dependência física, acompanhamos através de muitos gatilhos uma jornada de extrema angústia e desespero enquanto o mundo entra em contagem regressiva para a destruição.

Na vida da mulher atormentada aparecem outros dois personagens emblemáticos para a trama, sua irmã Claire (Charlotte Gainsbourg) e seu cunhado cientista John (Kiefer Sutherland), que são os responsáveis por hospedar a prestar os cuidados necessários junto a familiar enferma. Durante o desdobramento da obra, é notório o contraste de pensamentos do casal em relação a ameaça espacial que aflige toda a população. Claire se mostra uma mulher sensível e extremamente preocupada com futuro, enquanto John é insuportavelmente cético e incrédulo sobre o destino trágico que os aguarda.

Chegamos em 2020 e uma pandemia global assola os continentes. Centenas de milhares de pessoas já morreram infectadas pelo vírus que se originou de maneira misteriosa na China. A depressão já é figura recorrente perante o contexto histórico em que vivemos, pois a ansiedade e a incerteza no amanhã geram o cenário perfeito para o agravamento de quadros pré- existentes e surgimento de crises agudas.

Para completar a similaridade narrativa, existem aqueles que estão impactados por tudo isso que acontece atualmente, no entanto o que testemunhamos nas ruas e noticiários são indivíduos cegos e irresponsáveis colocando as suas vidas e a de próximos em risco.

Dessa maneira está completa a transposição de características do trio de protagonistas. Tudo alegórico demais, né?

Assim como na ficção, presenciamos tempos difíceis que exigem muita sobriedade para lidar com as perdas globais e tragédias pessoais. No final, resiste um universo particular em cada um de nós, onde administrar os anseios e se privar de atividades triviais se tornou exigência básica de sobrevivência, trazendo para a realidade várias medidas antes vistas apenas nas telas e salas de projeção.

Todos esperamos que não seja necessária uma catástrofe irreversível inspirada no cinema para que a humanidade consiga encontrar um novo caminho e fazer definitivamente a sua parte para amenizar os danos. O tempo é impiedoso e a colisão se aproxima.

Cada dia mais perto.

Cada vez mais inevitável.