Carlos Ruas é, há muito tempo, um dos cartunistas mais conhecidos da internet brasileira. Seu traço bastante particular é reconhecido imediatamente quando nos deparamos com alguma de suas tirinhas; sejam os deuses muito loucos de “Um Sábado Qualquer”, — seu trabalho mais conhecido, “Cães e Gatos” (cujo nome é auto explicativo) ou Mundo Avesso, que trata de questões mais filosóficas. O universo criado por Ruas já gerou centenas (talvez milhares) de tirinhas hilárias, livros, pelúcias e uma legião de fãs internet afora. Hoje, o Nerd Zoom conta um pouco mais desse universo para vocês! Bora lá?
(André Walker| Nerd Zoom) Boa tarde, Carlos! O Nerd Zoom agradece pela entrevista!
(Carlos Ruas) Boa tarde, pessoal! Muito obrigado pelo convite, fico imensamente feliz. Gostaria de agradecer ao André pela paciência e parabenizar a equipe pelo trabalho.
(Nota Nerd Zoom: a entrevista demorou um pouco para rolar porque o Ruas estava em meio a eventos e outras tarefas)
(André Walker| Nerd Zoom) Como grande parte dos artistas no Brasil, você tinha outro emprego antes de se estabelecer na carreira. Que emprego era esse e como foi a transição para o atual?
(Carlos Ruas) Sou formado em Design gráfico, e trabalhava na área em uma empresa cultural, aos 23 anos, dividindo meu tempo em criar conceitos artísticos para clientes e postar tiras no blog pessoal, na época quando os blogs eram sucesso.
(André Walker| Nerd Zoom) Hoje em dia você já tem um lore estabelecido e conhecido pelos fãs, mas no início, você já tinha em mente uma base para o universo “Um Sábado Qualquer” ou isso foi se criando aos poucos?
(Carlos Ruas) No início eu nem imaginava como tudo aconteceria, sempre gostei muito de adquirir conhecimento entre religião e ceticismo no geral. As ideias iam surgindo e eu ia criando as tirinhas, no início era um Hobbie. Quando vi, o Um Sábado Qualquer começou a se tornar o que é hoje. Ainda é uma surpresa ver o quanto esse Hobbie cresceu, virando uma marca, um produto e impactando milhares de pessoas.
(André Walker| Nerd Zoom) Esse seu interesse pela religião e pelas mitologias de diferentes culturas já existia ou surgiu a partir do trabalho como cartunista?
(Carlos Ruas) Sempre fui muito curioso. Estudei em escola católica, minha avó era espírita kardecista e meu Pai ateu, cresci em uma lambança religiosa familiar, mas acredito que isso foi importante para a minha curiosidade e para a futura criação do Um Sábado Qualquer.
(André Walker| Nerd Zoom) Nos tempos de hoje muitos artistas se estabelecem no espaço da internet, você se imagina conseguindo desempenhar trabalhos como “Um Sábado Qualquer”, “Cães e Gatos” e “Mundo Avesso” sem a existência das ferramentas que temos hoje?
(Carlos Ruas) Seria muito difícil. Antes a única mídia que existia para divulgar seu desenho era a impressa, era um mercado muito pequeno, um jornal gigante possuía apenas um chargista. A mídia virtual chegou para democratizar e expandir este mercado. Hoje, qualquer um recém saído da faculdade, consegue divulgar seus desenhos através das redes sociais, sem ter que pagar nada, sem nenhum custo. Há 13 anos, quando comecei, eu podia contar nos dedos os desenhistas brasileiros que eu conhecia, hoje, temos um Artist Valley na CCXP com mais de 400 desenhistas.
(André Walker| Nerd Zoom) Citando ainda as três vertentes do seu trabalho, você pode explicar para nós de que trata cada um dos títulos?
(Carlos Ruas) Bem o “Cães e gatos” trabalha a questão do convívio, por isso que muitos casais se identificam, na vida sempre existe um cão nos relacionamentos ou um gato. Acabei morando um período com duas amigas minhas e elas tinham a Diana, o cão que inspirou muito em atitudes, como fazer o xixi da alegria, lamber sem parar, desastrada e cheia de amor pra dar. Devo muito da personalidade do cão a Diana.
Já o “Mundo Avesso” é uma filosofia ilustrada. Tem tirinhas mais reflexivas que não cabem nem no USQ e nem no Cães e gatos, e tornam-se mundo avesso. É o meu lado mais filosófico.
O Um Sábado Qualquer também trabalha com reflexão, mas sem deixar de lado o humor. Prego a diversidade, colocando todos os Deuses na mesma mesa de boteco, trocando farpas, debates e reflexões.
(André Walker| Nerd Zoom) Seu trabalho mais conhecido, o “Um Sábado Qualquer”, trata de um assunto espinhoso, a religião. O Brasil, como sabemos, tem vivido uma escalada de intolerância, ódio e ataques na internet. Como você explica o fato de o seu trabalho sofrer muito menos hate em relação a outros artistas em evidência na internet?
(Carlos Ruas) Acho que virei “café com leite”. Após 13 anos, as pessoas entenderam o que eu prego em minhas tirinhas, e como faço humor com todos e com muito cuidado, as pessoas não se sentem alvos direcionados, com o único intuito de ofender, isso gera retaliação. A minha ideia é gerar debate, e acredito que ambos os lados entenderam.
(André Walker| Nerd Zoom) Recentemente você lançou o livro “De onde viemos?” no qual você recrutou uma série de outros artistas para o desenvolvimento da obra. Você pode contar para a gente sobre esse trabalho e sobre o processo de escolha dos artistas?
(Carlos Ruas) Esse projeto era algo que desejei muito. Escolhi os artistas pensando também
no traço de cada um e pelo contexto da obra, não foi fácil. Muitos só conhecem o criacionismo bíblico, o erguendo como a grande verdade, como uma sutil alfinetada, eu quis trazer mais 12 verdades, criacionismos de diversos povos. Tive o cuidado de colocar também as visões de criação do mundo dos povos que vieram da África e dos povos originários.
(André Walker| Nerd Zoom) Seu trabalho tem uma identidade bastante única (inclusive é bastante difícil identificar semelhanças com qualquer outra obra do gênero), pensando nisso, quais são as principais influências que te formaram como artista?
(Carlos Ruas) Se existe um panteão dos Deuses do quadrinho, eu colocaria Laerte no topo, seguido de Angeli, Quino e Henfil. Eles formaram o meu senso crítico, que eu transformo em desenhos.
(André Walker| Nerd Zoom) Você é um artista bastante conhecido na internet e com uma carreira consolidada, que também inclui livros. Existe algum outro projeto que você gostaria de realizar e ainda não teve a oportunidade?
(Carlos Ruas) A gente sempre quer mais coisas, não é? Mas tenho um desejo muito forte de fazer meu trabalho ser conhecido internacionalmente, divulgar meus livros lá fora e fazer com que o público de lá também saiba quem é Carlos Ruas. Já consegui lançar um livro em Francês, e estou com o projeto de tradução das tiras para inglês e espanhol.
(André Walker| Nerd Zoom) A última pergunta costuma ser reservada para indicações. Você poderia indicar três obras (literárias, audiovisual, dramaturgia, qualquer área) para os nossos leitores?
(Carlos Ruas) Recentemente vi “Pinóquio” do Guilherme del Touro e recomendo muito. Livro em quadrinhos recomendo “MAUZ”. Quem for curioso por ciência, recomendo “A Dança do universo” do Marcelo Gleiser e “Cosmos” do Carl Sagan.
(André Walker| Nerd Zoom) A última pergunta é um pedido de fã! Você poderia fazer um rabisco para o Nerd Zoom publicar no corpo dessa entrevista?
(Carlos Ruas) É pra já!
(André Walker| Nerd Zoom) Novamente, obrigado pela conversa!
(Carlos Ruas) Eu agradeço pelo papo, e até a próxima!
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