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Loki e as loucuras pelo “glorioso propósito”

Segunda temporada de Loki já está entre nós, e fica a pergunta: você realmente sabe qual é o seu propósito?

As desventuras do deus da trapaça pelo multiverso, além de ser divertido, também nos faz pensar: “Qual é o nosso verdadeiro ‘glorioso propósito’”?

Postêr Oficial da segunda temporada | Foto: Divulgação

ATENÇÃO! ESTE TEXTO CONTÊM SPOILERS

O final da segunda temporada de Loki já está entre nós. Mas podemos dizer que deste mar de produções duvidosas da fase 4 da Marvel é a melhor destas produções? Talvez seja esse o seu “glorioso propósito”? Talvez.

Sem dúvida, essa é uma das produções mais densas filosoficamente e cientificamente do Universo Cinematográfico Marvel até agora. Ela nos instiga a pensar em coisas como: livre-arbítrio e o nosso papel no mundo, e na vida das pessoas ao nosso redor, e como nem sempre o grandioso é o que nos faz mais feliz. Talvez seja até mesmo a motivação errada.

O Glorioso Propósito

Vindo dos termo latim proponere, cujo o pro significa “à frente” e ponere pode ser traduzido como “colocar”, o significado de propósito pode ser definido como “colocar à frente”, “expor à vista”, o que pode ser dito como uma tomada de decisão.

Um questionamento que Loki traz, principalmente na primeira temporada, é uma reflexão sobre o porque do propósito? Qual é o real sentido dele? Principalmente nos primeiros episódios da série lançada lá em 2021. Quem não se lembra dele se questionando sobre o poder das joias do infinito?

De toda forma, a filosofia explica isso. Ou tenta pelo menos. Aristóteles falava, já três séculos antes de cristo, que o propósito da vida é a busca pela felicidade. Apesar desse pensamento ter sido altamente deturpado hoje em dia, ainda é uma realidade. 

Chegamos a uma resposta? Alguns podem até dizer que sim. Mas infelizmente, como diria Thanos em Guerra Infinita: “A realidade tende a ser decepcionante”.

A verdade sobre o “glorioso propósito”

Aristóteles entendia que o objetivo de um grande propósito era na verdade, o encontro de todo o ser humano consigo mesmo, e com o seu talento, e a partir disto, usá-lo para melhorar a realidade ao seu redor. Esse é o sentido do propósito. Ou se preferir: do “glorioso propósito”.

É justamente neste ponto que reside a genialidade do roteiro de Loki. Você se lembra que no filme Os Vingadores (2012), Loki, ao se confrontar com Thor comenta que ele deveria dominar a terra por ser um deus, e logo o seu poder fazia dele o mais capacitado para liderar os humanos sob punho de ferro?

Pois então, no arco do Loki normal, aquele que morre pelas mãos de Thanos em Guerra Infinita, ele nunca teve uma chance real de redenção, pelo fato dele nunca chegar no seu real objetivo.

A série até brinca com isso na primeira temporada, no episódio dos Loki variantes, e na segunda temporada, onde Brad o lembra sobre ele estar sempre fadado à perder. Guarde essa informação.

Quando Loki finalmente olha para o panorama geral das coisas, principalmente na segunda temporada, ele começa a ver como toda a sua trajetória, em busca do seu ideal de “glorioso propósito” é algo muito frustante, pois ele começa a se ponderar se este é realmente seu objetivo de vida.

Quem não se lembra do icônico momento em que o Loki mais velho salva todo mundo? | Foto: IMDB

A frustração com o “glorioso propósito” errado

Vimos no primeiro filme do Thor (2011), que o Loki sempre foi bastante rejeitado por Odin, apesar do Pai de Todos ter a sua “redenção” em Ragnarok (2017). Isso acabou criando dentro de sua própria psique uma necessidade de ser notado pelas pessoas. E como isso pode ser feito na noção dele? Através do poder.

Esse tipo de motivação fica ainda mais clara se procurarmos respostas dentro da psicologia. Segundo um estudo realizado nos anos 60 por David McClelland, um notório psicólogo norte-americano, existem três principais fatores de necessidade que nos motivam a realizar coisas, sejam elas boas ou más:

  • Necessidade de realização: Essa vem com o sucesso, geralmente avaliado por um padrão individual de excelência;
  • Necessidade de filiação: Realização que vem somente através do relacionamento com outras pessoas, seja amoroso, sexual ou de amizade;
  • Necessidade de poder: Controle ou influencia direta, ou indireta, sobre outras pessoas. Nem preciso dizer que essa é a que mais se encaixa com o Loki, certo? Errado.

McClelland aponta que uma necessidade insatisfeita cada vez mais intensa, produz um crescente sentimento de frustração e ansiedade. “Como consequência dessa frustração, pode ser que uma pessoa adote um comportamento de fuga, compensação, agressão ou deslocamento”. E quem é que mais se encaixa nesse perfil? Ele mesmo: o Loki.

O poder da experiência

Mas como podemos saber qual é realmente o nosso verdadeiro propósito? Loki também se depara com essa dúvida na série. Ele se auto-engana ao longo dos episódios, mascarando as sua verdadeira motivação atrás de necessidade de poder, e até mesmo de se tornar um herói.

O próprio McClelland aponta que identificou através de seu estudo que frequentemente as reais motivações, aquelas que nos impulsionam a agir, permanecem desconhecidas até mesmo para nós. Isso geralmente faz com que lutemos para conquistar coisas que não são verdadeiramente aquilo de que precisamos. Às vezes, nossos propósitos, pelos quais lutamos e acreditamos, podem não ser realmente o que queremos.

Porém, Loki só vai entender realmente o que o motiva, quando ele conversa com a Sylvie no quinto episódio da segunda temporada, onde eles conversam sobre o real objetivo do Loki fazer tudo aquilo, sendo algo de certo ponto de vista até mesmo egoísta: ele gostaria somente de ter seus amigos de volta. Olha a necessidade de filiação ai. 

Entretanto, esse tipo de “iluminação” só foi possível atráves de uma série de experiências que alteraram sua noção de realidade. Na filosofia a experiência é entendida como um evento consciente em um sentido amplo. Isso se encaixa em experiencias perceptivas, corporais, memoriais, imaginativas, emocionais, de emoção, desejo, ação e pensamento.

A partir do momento que você vivencia isso, você toma uma nova noção de consciência que te permite ver o mundo, e a si mesmo, de uma nova forma. E por conta disso, Loki percebe o quanto essa necessidade egoísta parte somente dele de resgatar todos e voltar tudo ao que era antes. Até o momento em que ele percebe que nada disso vai adiantar, e de que ele precisa ser melhor do que isso. 

Ele gosta de se exivbir. Não é mesmo? | Foto: IMDB

O verdadeiro “glorioso propósito”

Através de uma jornada de autoconhecimento, Loki conseguiu enxergar as verdadeiras motivações por que ele estava tentando dominar tudo e recalibrar suas ações para algo ainda maior: o resgate de todas as linhas temporais. 

Entretanto, Loki só toma noção disso tudo, quando ele não pode invocar seus poderes dentro da TVA, e isso faz com que ele se rebaixe a condição de humano, com motivações e consequências de atos que todos nós, se estivéssemos ali, teriamos que enfrentar de qualquer maneira.

Mas a grande reviravolta acontece quando Loki se conecta com essas pessoas e consigo mesmo. Ele compreende o quão precioso é manter tudo aquilo funcionando, todas as realidades operando completamente, com possibilidades infinitas.

No entanto, para que algo dessa magnitude possa ser mantido, é preciso que alguém cuide disso, preferencialmente de fora. 

Assim, Loki faz o sacrifício supremo de se tornar o deus do multiverso (ou seja lá qual for a sua interpretação da divinidade que ele se tornou), transformando o que antes era uma máquina de destruição de realidades em um ecossistema temporal no formato de uma árvore, onde nada realmente morre, mas se transforma em algo novo. Ele literalmente se torna a Yggdrasil, a árvore da vida.

O sacrífício supremo. Quem viu sabe | Foto: IMDB

Podemos dizer que Loki é uma jornada de autoconhecimento que nos ensina a ver o mundo com novos olhos. Através de nossas experiências e traumas, somos motivados a olhar para o mundo com uma perspectiva renovada, compreendendo que o glorioso propósito não reside em nós mesmos, mas sim em nos sacrificarmos pelos outros em prol dos outros.

Embora este texto tenha se concentrado apenas no personagem principal, em breve farei uma análise dos personagens coadjuvantes. Apesar de suas histórias individuais, todos se unem em uma única mensagem. Como diria Aquele Que Permanece: “Até Logo!”.